Conto "Ainda me encontro lá"
Ainda me encontro lá
Ele não sente as minhas dores. Tento me consolar repetindo isso para mim mesma.
Minha memória ficou presa naquele dia em que dei o primeiro passo para mudar minha vida para sempre, e consequentemente a dele também. Quando me dei conta, estava perdida, em lugar nenhum. Vejo-me paralisada naquela cena, arrumando coisas para partir. Triste momento. Triste decisão.
Passaram-se dez anos e ainda estou lá, no mesmo ponto de partida, como que desejando chegasse alguém, um anjo, com poderes para tirar aquela ideia fixa da minha cabeça, e como numa interdição forçada – mas necessária, eu fosse dopada e só acordasse quando minha razão estivesse de volta. Entretanto, não aconteceu. Joguei-me do abismo da inconsciência, quebrei-me toda, desmanchei-me em pedaços tão indefinidos que se tornou impossível minha reconstrução.
Sigo em recortes aleatórios. Às vezes me reconheço, noutras não.
Ele não sente as minhas dores. Ainda bem.
Lairte, Serrinha/BA, dez/2020.
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