Conto: Purgatório.

         

                                    Conto: Purgatório.

        Beatriz subiu, com dificuldade, na cabine alta de um caminhão que parou. Não entrava ônibus ali. Tentou ligar para motoboy, sem sucesso. Poucos metros à frente, chegando ao seu destino, ela abre a porta do caminhão e, sem noção da altura, desce, esborrachando-se no chão.

        Foi assim. Depois de batalhar tanto para alcançar aquele objetivo de transferência para outra cidade, estava Beatriz ali, no fim do mundo, numa estrada deserta, esperando transporte que a levasse até a cidadezinha onde passou a trabalhar. 

       Questionava-se: Até que ponto devemos insistir, persistir com uma ideia, um plano, quando este parece avisar que não vai ser bom, dizendo não, não, diversas vezes. Quando se está numa situação de conforto, que inquietação insana é essa que nos faz trocar uma vida calma, estável, pelo desconhecido? Pois foi assim com Beatriz. A coragem de arriscar-se pelo que pouco sabia, não foi uma decisão inteligente. Enfrentou dragões da corporação, as inseguranças masculinas no mundo do trabalho de hoje, para aqueles que veem a mulher como uma ameaça aos seus cargos; conheceu o autoritarismo; conheceu a solidão. Mas também conheceu pessoas incríveis e humanas que a ajudaram não enlouquecer naquele lugar. Porém, nada que compensasse todas as perdas sofridas, refletiu desolada.

        Muitas vezes ficamos perdidos na encruzilhada, tentando encontrar a nossa vida ideal. Quem não sabe o que quer, acaba se deixando levar pelas adversidades, concluiu.

       Mas ainda tinha fôlego para reverter a situação. Ainda possuía disposição para consertar toda sua vida novamente. Louca, entrou em transe e já não sabia mais o que fazia. Ia tomando decisões, alterando o curso das coisas planejadas anteriormente, e mais, e mais, compulsivamente fugindo da sua realidade.

        Beatriz saiu daquele lugar, como quem escapava do inferno. Decepcionada, só queria sua vida tranquila de volta. Foi para lugar seguro. Teve uma trégua. Iniciou nova batalha, mas isso é outra história...

                                                                                  Lairte Souza                                                                                                Serrinha/BA, janeiro/2021.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Crônica: Lembranças de uma seca

Reflexões de um bebê

EPAMINONDAS: Galho do Jacarandá, folhas do Eucalipto